terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Marxismo na Literatura

“Eu, Etiqueta”
Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou cartório,
Um nome...estranho.
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nesta vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produto
Que nunca experimentei (...)
(...) meu isso, meu aquilo,
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidência,
Costume, hábitos, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim um homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, na moda.
É doce estar na moda, ainda que a moda
Seja negar a minha identidade,
Trocá-la por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos de mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim-mesmo.
Ser pensante, sentinte e solidário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio (...)
(...) Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscina,
E bem à vista exibo esta etiqueta (...)
(...) Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher? (...)
Hoje sou costurado, sou tecido,
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante, mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mas artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu novo nome é coisa.
Eu sou a coisa, coisamente. 
                                                                                                                                                                          (ANDRADE, Carlos Drummond. Corpo. 10. Ed. Rio de Janeiro: Record, 1987.)


O nosso grande mestre da literatura Carlos Drummond Andrade traz implicitamente no texto acima “Eu, Etiqueta” as ideias do pai do comunismo Karl Marx (1818-1895). Eis, que Karl Marx foi um grande revolucionário e suas ideias são refletidas e debatidas nos dias atuais em varias áreas do conhecimento, tais como Filosofia, História, Sociologia, Ciência Política, Antropologia, Psicologia, Economia, Geografia e outros.
 Marx foi o primeiro a conscientizar a classe proletária de sua situação e mostrar suas condições de emancipação. Segundo Karl Marx, a historia da humanidade poderia ser considerada como a história da alienação humana. A concepção de alienação em Marx é categórica, porém trataremos aqui da alienação que cristaliza-se tanto na parte produtiva por meio da qual o homem é submetido a trabalhar horas por dia e quanto na exploração que é exercida encima desse. Dessa maneira faremos uma ponte com o pensamento de Carlos Drummond Andrade com as ideias Marxistas em relação à produção em massa, a alienação que acontece no meio de produção e a perda da identidade do indivíduo.  
O nascimento desta neurose se deu com o surgimento da Revolução Industrial, sendo assim, o capitalismo se alastrou como uma epidemia incurável dando margem a uma distinção de opressores e oprimidos, mestres e aprendizes, capitalistas e proletariados. Marx classificou isso como A luta de classes em seu livro (Manifesto do Partido Comunista 1848). “Nas palavras de Carlos Drummond o “eu, etiqueta”, o “homem anúncio” demonstra perfeitamente o que Marx diz a respeito da falta de autenticidade perante a matéria produzida pelo proletário. Na visão de Marx, nas cadeias produtivas ocorre uma troca de papeis, ou seja, a mercadoria produzida se torna sujeito e o sujeito se torna mercadoria, se torna um objeto. É dessa forma que o sujeito torna-se alheio, ou melhor, aliena-se e perde o que tem de mais valioso: sua identidade.
Essa é a grande critica que ambos os autores observaram no Capitalismo, no qual, o sujeito perde sua autonomia. Citando uma das frases de Drummond para que possamos sintetizar o nosso objetivo: (...) Onde terei jogado fora meu gosto e capacidade de escolher? (...) nesta frase percebemos a grande alfinetada em nosso senso critico adormecido pela sedução da publicidade e das propagandas que a mídia nos oferece como um ópio do qual resulta um sono profundo de alienação.  Enfim, segundo Marx, a abolição da propriedade privada, a extinção do capitalismo seria a emancipação do homem alienado. Sabemos que essas ideias são muitas vezes consideras utópicas, mas sabemos também que elas estão em vigor e que muitas delas são consideradas como manuais de espíritos livres que almejam uma felicidade universal e desacreditam que o homem é apenas uma peça substituível.

    

“Proletariados uni-vos”
Karl Marx